Introdução à Urgência e Emergência em Animais de Pequeno Porte

Casos Clínicos e Suporte Prolongado

Intoxicações e Envenenamentos

 

A intoxicação e o envenenamento são emergências veterinárias que podem comprometer gravemente a saúde de cães e gatos, muitas vezes de forma súbita e progressiva. O reconhecimento rápido dos sinais, o conhecimento sobre substâncias tóxicas mais comuns e a aplicação de protocolos de descontaminação e antídotos são fundamentais para salvar vidas e minimizar danos.

Reconhecimento dos Sinais de Intoxicação

Os sinais de intoxicação variam de acordo com a substância ingerida, inalada ou em contato com o animal. No entanto, alguns sintomas gerais podem ser observados:

· Gastrointestinais:

Vômito, diarreia (frequentemente com sangue), salivação excessiva e perda de apetite.

· Neurológicos:

Convulsões, tremores, desorientação, fraqueza, letargia ou hiperatividade.

· Respiratórios:

Dificuldade para respirar, respiração ofegante ou rápida.

· Cardiovasculares:

Frequência cardíaca aumentada ou reduzida, arritmias.

· Mucosas e pele:

Mucosas pálidas, cianose (coloração azulada), vermelhidão ou queimaduras na boca ou no focinho.

· Outros:

Dilatação das pupilas, sangramentos ou alterações no comportamento (agressividade ou apatia).

Atenção: O tempo é um fator crítico. Ao notar sinais de intoxicação, leve o animal ao veterinário imediatamente, preferencialmente com informações sobre a substância ou produto ao qual ele foi exposto.

Substâncias Tóxicas Mais Comuns para Cães e Gatos

Várias substâncias, comuns no ambiente doméstico, representam riscos de intoxicação para cães e gatos. Entre as mais frequentes estão:

1. Alimentos:

Chocolate (teobromina), uvas e passas, cebola, alho, xilitol (adoçante artificial).

2. Produtos químicos e de limpeza:

Álcool, alvejantes, detergentes, pesticidas, raticidas.

3. Medicamentos de uso humano:

Paracetamol, ibuprofeno, aspirina, antidepressivos.

4. Plantas tóxicas:

Lírio, comigo-ninguém-pode, azaleia, antúrio.

5. Substâncias recreativas:

Álcool, nicotina, maconha.

6. Outros:

Produtos veterinários mal administrados (ex.: superdosagem de antiparasitários).

Protocolos de Descontaminação e Uso de Antídotos

O tratamento de intoxicações varia conforme a substância envolvida e a gravidade do caso. Alguns passos gerais incluem:

1. Identificação da substância:

Sempre que possível, leve a embalagem ou rótulo do produto ao veterinário. Isso facilita a identificação do agente tóxico e o tratamento.

2. Descontaminação:

Indução do vômito:

§ Apenas sob orientação veterinária e nunca em casos de

ingestão de substâncias corrosivas (ex.: ácidos ou álcalis) ou derivados de petróleo.

§ Pode ser utilizado peróxido de hidrogênio (3%) em doses calculadas pelo veterinário.

Lavagem gástrica:

§ Realizada apenas em ambiente clínico, sob anestesia, para remover substâncias ingeridas do estômago.

Carvão ativado:

§ Ajuda a absorver toxinas presentes no trato gastrointestinal, reduzindo sua absorção pelo organismo.

Banho em casos de contato dérmico:

§ Utilize água morna e sabão neutro para remover resíduos químicos da pele e pelagem.

3. Uso de antídotos específicos:

Envenenamento por anticoagulantes (raticidas):

§ Vitamina K1 como antídoto.

Intoxicação por opioides:

§ Naloxona.

Intoxicação por inseticidas organofosforados ou carbamatos:

§ Atropina.

Envenenamento por metemoglobinemia (ex.: paracetamol):

§ N-acetilcisteína.

4. Suporte clínico:

Terapia intravenosa: Para hidratação, eliminação de toxinas e estabilização.

Controle de convulsões: Administração de anticonvulsivantes, como diazepam.

Oxigenoterapia: Em casos de dificuldade respiratória.

Conclusão

A intoxicação e o envenenamento em cães e gatos são situações de alta gravidade que requerem atenção imediata. O reconhecimento precoce dos sinais, o conhecimento sobre as substâncias tóxicas mais comuns e a aplicação de protocolos adequados de descontaminação e tratamento são essenciais para aumentar as chances de recuperação. O atendimento rápido e eficiente pode fazer toda a diferença para salvar a vida de um animal.


Distúrbios Metabólicos e Neurológicos em Cães e Gatos

 

Distúrbios metabólicos e neurológicos são condições que frequentemente demandam atenção emergencial na medicina veterinária. Eles podem afetar severamente a saúde de cães e gatos, muitas vezes de forma súbita. Compreender condições como hipoglicemia, hipocalcemia, convulsões e os métodos para avaliação neurológica básica é essencial para o diagnóstico e manejo adequado.

Hipoglicemia, Hipocalcemia e Outros Distúrbios Metabólicos

1. Hipoglicemia
A hipoglicemia é caracterizada pela baixa concentração de glicose no sangue, sendo uma condição potencialmente fatal, especialmente em filhotes, animais com doenças metabólicas ou em casos de jejum prolongado.

Causas comuns:

§ Filhotes de raças pequenas (ex.: yorkshire, maltês) devido a estoques insuficientes de glicogênio.

§ Diabetes mellitus tratado com insulina em excesso.

§ Doenças hepáticas ou renais.

Sinais clínicos:

§ Fraqueza, letargia, tremores musculares, convulsões e colapso.

Manejo:

§ Administre

glicose oral (ex.: mel ou glicose líquida aplicada na gengiva).

§ Em casos graves, forneça glicose intravenosa em ambiente clínico.

2. Hipocalcemia
A hipocalcemia ocorre quando há níveis baixos de cálcio no sangue, sendo comum em fêmeas lactantes (eclâmpsia) ou em casos de insuficiência renal.

Sinais clínicos:

§ Tremores musculares, rigidez, taquicardia, hiperexcitabilidade e convulsões.

Manejo:

§ Administre cálcio intravenoso sob monitoramento, pois uma administração inadequada pode causar arritmias.

3. Outros distúrbios metabólicos:

Acidose metabólica: Resultante de condições como insuficiência renal ou cetoacidose diabética, caracterizada por respiração rápida e letargia.

Hiponatremia ou hipernatremia: Desequilíbrios nos níveis de sódio podem causar desidratação celular ou edema cerebral, resultando em convulsões ou alterações comportamentais.

Convulsões: Manejo e Controle

As convulsões são manifestações neurológicas que ocorrem devido à atividade elétrica anormal no cérebro. Elas podem ser generalizadas ou focais e geralmente indicam uma condição subjacente, como intoxicações, doenças metabólicas ou distúrbios neurológicos.

Identificação das convulsões:

· Fase inicial (aura): Alterações comportamentais, como inquietação ou vocalização.

· Fase ictal: Tremores involuntários, perda de consciência, salivação excessiva, rigidez ou movimentos musculares descoordenados.

· Fase pós-ictal: Letargia, confusão, ataxia ou fome excessiva após a crise.

Manejo durante a convulsão:

· Evite manipulação excessiva: Não tente segurar o animal durante a crise, apenas remova objetos próximos que possam causar ferimentos.

· Ambiente seguro: Mantenha o animal em local calmo e escuro.

· Controle da crise: Administre anticonvulsivantes, como diazepam ou midazolam, por via intravenosa ou retal, sob orientação veterinária.

Cuidados pós-crise:

· Observe sinais de recuperação e procure atendimento veterinário para investigação da causa subjacente.

· Investigue possíveis gatilhos, como intoxicação, hipoglicemia ou epilepsia idiopática.

Avaliação Neurológica Básica

Uma avaliação neurológica básica ajuda a identificar sinais de comprometimento do sistema nervoso central ou periférico. Os principais passos incluem:

1. Histórico e observação inicial:

Pergunte ao tutor sobre alterações comportamentais, convulsões ou histórico de traumas.

Observe o animal em repouso e em movimento, avaliando coordenação, postura e comportamento.

2. Reflexos neurológicos:

Reflexo pupilar: Verifique a contração da pupila

ao estímulo de luz. Pupilas dilatadas ou desiguais indicam problemas neurológicos.

Reflexo palpebral: Toque levemente a pálpebra e observe o fechamento do olho.

Reflexo de retirada: Estimule o membro e avalie a resposta de retirada.

3. Avaliação postural e motora:

Propriocepção: Posicione um membro de forma anormal (ex.: virando a pata para baixo) e observe se o animal corrige a posição.

Marcha: Avalie a coordenação e força durante o deslocamento.

4. Teste de resposta à dor:

Pressione levemente as extremidades para verificar reações, diferenciando dor superficial e profunda.

Sinais de alerta:

· Tremores persistentes, perda de equilíbrio, inclinação da cabeça, andar em círculos ou alterações no nível de consciência requerem atenção imediata.

Conclusão

Distúrbios metabólicos e neurológicos podem ser fatais se não forem reconhecidos e tratados rapidamente. Condições como hipoglicemia, hipocalcemia e convulsões exigem manejo emergencial e uma avaliação detalhada para determinar suas causas subjacentes. A avaliação neurológica básica é uma ferramenta valiosa para identificar problemas no sistema nervoso e direcionar o tratamento adequado. Com o conhecimento e as práticas corretas, é possível oferecer suporte vital eficaz e aumentar as chances de recuperação dos pacientes.


Comunicação com o Tutor e Encaminhamento ao Especialista

 

A comunicação eficaz entre o veterinário e o tutor do animal é um elemento essencial no atendimento de urgências e emergências veterinárias. Além de garantir que o tutor compreenda a gravidade da situação, essa interação ajuda a estabelecer um plano claro de cuidados posteriores e, quando necessário, um encaminhamento para clínicas especializadas. A seguir, exploramos os principais aspectos desse processo.

Importância da Comunicação Clara e Eficaz com o Tutor

O tutor é uma parte vital no cuidado do animal, e a comunicação deve ser clara, empática e objetiva.

1. Transmitir informações com clareza:

Explique a condição do animal de forma compreensível, evitando termos excessivamente técnicos, mas sem minimizar a gravidade da situação.

Utilize linguagem simples e, se necessário, ilustre com exemplos ou diagramas para reforçar a explicação.

2. Empatia e suporte emocional:

Reconheça as preocupações do tutor, especialmente em situações de emergência. Um tom calmo e seguro ajuda a tranquilizá-lo.

Mostre-se disponível para responder dúvidas e oferecer orientações detalhadas.

3. Registro e documentação:

Forneça relatórios escritos ou impressos sobre

relatórios escritos ou impressos sobre o diagnóstico, tratamentos realizados e próximos passos.

Explique detalhadamente os medicamentos prescritos, incluindo dosagens, horários e possíveis efeitos colaterais.

Orientações sobre Cuidados Posteriores ao Atendimento

Após o atendimento emergencial, é crucial orientar o tutor sobre os cuidados que o animal precisará durante sua recuperação.

1. Cuidados domiciliares:

Informe sobre a necessidade de repouso, alimentação especial ou restrições de movimento.

Ensine o tutor a monitorar sinais de alerta, como febre, inchaços, alterações no apetite ou comportamento.

2. Administração de medicamentos:

Explique como e quando os medicamentos devem ser administrados. Se possível, demonstre a aplicação (ex.: pomadas ou injeções subcutâneas).

Reforce a importância de seguir o esquema prescrito rigorosamente.

3. Monitoramento contínuo:

Oriente o tutor a observar parâmetros como frequência respiratória, cor das mucosas e comportamento geral.

Destaque a importância de relatar qualquer alteração imediatamente à clínica veterinária.

4. Revisões periódicas:

Informe sobre a necessidade de retorno para avaliações ou exames complementares.

Esclareça os benefícios do acompanhamento regular para prevenir complicações.

Critérios para Encaminhamento a Clínicas Especializadas

Algumas situações exigem cuidados que vão além dos recursos disponíveis na clínica inicial. Nesses casos, é importante encaminhar o animal a um especialista ou unidade de maior complexidade.

1. Condições que requerem especialistas:

Doenças complexas ou crônicas: Ex.: cardiomiopatias, distúrbios neurológicos ou metabólicos graves.

Casos cirúrgicos avançados: Fraturas complexas, traumas abdominais ou torácicos severos.

Situações que necessitam de equipamentos especializados: Ventilação mecânica, hemodiálise ou monitoramento intensivo contínuo.

2. Critérios de encaminhamento:

A decisão deve ser baseada na gravidade do caso, nos recursos disponíveis na clínica e no prognóstico do animal.

Comunique claramente ao tutor os motivos do encaminhamento e os benefícios de um atendimento especializado.

3. Contato prévio com a clínica especializada:

Antes do encaminhamento, entre em contato com a unidade de destino para garantir que o caso possa ser recebido imediatamente.

Envie um relatório detalhado com o histórico, procedimentos realizados e resultados de exames.

4. Acompanhamento pós-encaminhamento:

Mantenha contato com a clínica especializada para acompanhar a evolução do

contato com a clínica especializada para acompanhar a evolução do caso.

Informe o tutor sobre o papel da clínica inicial no suporte contínuo, garantindo confiança no atendimento.

Conclusão

A comunicação clara, eficaz e empática com o tutor é essencial para garantir o sucesso do atendimento emergencial e o cuidado posterior ao animal. Orientar de forma detalhada e fornecer suporte durante a recuperação contribui para o bem-estar do paciente e para a confiança do tutor no trabalho veterinário. Além disso, reconhecer os limites da clínica e encaminhar o caso a um especialista quando necessário demonstra responsabilidade e compromisso com a saúde do animal, oferecendo o melhor tratamento possível.

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